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03/06/2010

dário de uma louca parte I


Não faço idéia do por que estou aqui. Tenho certeza absoluta que não tem por quê. Dizem que estou aqui porque fantasio demais, que crio histórias, momentos que jamais existiram e que foi por culpa da última que estou aqui agora.
Concordo quando dizem que sou fantasiosa demais, imaginativa demais, mas é mentira que a última também era inverdade. Eu tenho como provar que não era, não é, fruto da minha imaginação. Você existe, eu sei. Eu tirei várias fotos onde estou abraçada a você e elas, estão todas grudadas no mural que está na parede do meu quarto. Eu passeei com você por todos os cantos dessa cidade, de mãos dadas. Eu cantei, enquanto você tocava violão na casa daquele seu amigo, que deveria estar aqui também, por que diz que não me conhece e quando eu pergunto por você, ele diz que você não existe e que eu sou louca. Mas o louco é ele, só pode. Como você não existe se é a coisa mais viva que já me aconteceu nesses 19 anos de vida. Você é real sim, de tanto que eu lembro como a sua mão foi violenta ao largar a minha naquele dia de sol.
Pergunto pro Tom, o meu médico, se você não veio me visitar, se nem sequer passou aqui pela frente, olhando para dentro, me procurando ou se não largou nenhum bilhetinho pra mim na recepção. Tom me diz que não existe nada. Nem bilhete, nem passeio, nem fotos, muito menos você. Eu já tô ficando com raiva dele; ele também não acredita em mim quando eu digo que foi com você que eu vivi os momentos mais fantásticos da minha existência; eu digo pra ele que o seu abraço era o mais reconfortante de todos. Ele me diz que é normal depois do trauma que eu passei criar algo ou alguém pra se sentir segura de todas as angústias e conforme eu for melhorando, eu vou esquecendo você. Mas se eu tivesse criado você como dizem, você não me deixaria, você faria com que eu ficasse segura; mas então, por que dizem que eu te criei se você me trocou? Você não é criado, você é carne e osso. Tô achando que até o Tom é louco; louco cego e malvado.
Eu pergunto pra ele, como alguém vai ser imaginário, se sai em fotos e aponto para o meu mural, em uma foto em que você sorri enquanto eu puxo os seus cachos. Ele diz que não tem foto nenhuma no quarto e finca uma seringa na veia do meu braço levantado. Não dá um minuto e eu apago de novo. Odeio quando eles me dopam; fazem isso pra meu não esperar você. Mas não adianta nada. Enquanto durmo, eu lembro, em sonho, do dia que você me abandonou e começo a gritar desesperada.
A Fátima, enfermeira daqui, vem correndo ver o que está acontecendo. Mas faz isso porque é obrigada, porque se fosse por ela, que eu morresse de tanto berrar. Eu não entendo porque ela é tão rancorosa, tão mal humorada. Um dia eu perguntei isso pra ela; só faltou ela pular no meu pescoço, vontade não lhe faltava, mas ela só não fez isso por uma tal de ética médica, sei lá, o que é isso. Sabe o que eu acho? Acho não, tenho certeza. Acho que ela é mal comida e por isso desconta isso nos pacientes daqui.
Ela é a única aqui que me chama de louca. Mas acho que a louca é ela. Ninguém apaixonado é louco, só não tem razão nos atos e isso não significa ser loucura. Olha eu, por exemplo, não sou louca, mas tô aqui por que te amo. Eu acho que a Fátima nunca se apaixonou, nunca soube o que é se entregar de verdade pra alguém, por isso ela é assim. Mas enfim, isso não é nada demais não. Eu só tenho pena dela por isso. Verdade.
E escuta, mesmo que os outros sejam cegos e não te vejam, eu sei que você existe. E mesmo tendo me trocado, eu te amo, E ainda tô esperando você vir me visitar. Não aguento mais receber só a visita dos meus pais. Eles são tão chatos quando vem aqui. Minha mãe não para de chorar e meu pai me pergunta onde foi que ele errou comigo. Vem. Tá!?
Daí quando você vier, eu posso provar pra todo mundo que você é de carne e osso. E jogar na cara da Fátima que eu não sou louca, e que ela é de verdade mal comida. E fazer o Tom parar de espetar aquela agulha no meu braço. E mostrar pra todo mundo que eu sou consciente. E que os loucos são eles.
Vem me visitar, tá!?