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16/07/2013

Transeunte.

Quando todos estavam acordando, eu ainda não tinha ido dormir.

Não me permitia dormir sem entender o mínimo do que tinha acontecido naquele quarto, naquelas últimas horas. Do abraço ao tapa, tudo correndo pelos meus olhos de uma maneira completamente desconexa e sem sentido. O que foi que eu fiz? Como eu tinha acabado naquela sarjeta, com a maquiagem borrada e o coração aos saltos dentro do peito? O que aconteceu nessa última noite? Precisava de uma explicação que só eu poderia me dar. Mas eu não conseguia. Raios, por que eu não conseguia responder essa pergunta simples? No telefone uma chamada não atendida e na alma, o vazio de se sentir perdida.

Sentia frio, mas era fevereiro. Era domingo. Era carnaval. O bloco não demoraria a passar. E eu continuava estática, na areia da praia, olhando pro nada. Na cabeça uma interrogação, na carne um arranhão e no peito, um vazio. Era tarde e eu não queria mais pensar naquilo. Quando é festa, o que nos exigem é diversão. Eu só queria entender o motivo da existência humana e debater Foucault numa mesa de bar com todos os cultos do universo. Mas que droga, eu não sou culta, por que de querer isso? Era um vírus, uma loucura. Como todas as outras, como tudo que já tinha acontecido.

Garrafas jogadas pelos cantos e o cheiro de vinho impregnado na minha roupa. Talvez de volta aos tempos Medievais, talvez uma rainha. Talvez uma nobre imponente ou somente a filha de um ferreiro qualquer, que apenas serve para dar luz a bastardos. Despertei. Meus sonhos cada vez mais confusos, minha mente cada vez mais distorcida. O que é verdade em tudo isso? Na mão uma faca, no chão sangue e no espelho... nada. Eu não me via refletir. Eu não existia mais. Minhas dúvidas me consumiram e me tomaram, até me transformar em pó. Por que ainda dói meu peito, se não existe mais nada aqui dentro?

De volta à realidade, um posto de gasolina e uma saudade. Por que precisa ser assim? Talvez o tempo cure, talvez os ventos mudem. Talvez uma vida toda. Talvez seja um quase nada escondido nas entrelinhas da esperança que apodreceu e que não tem a mínima vontade de renascer. O que está morto, não pode morrer. Se morrer uma vez, permaneça morto. Ninguém disse adeus. Não existe adeus pra uma coisa que não existiu. Ninguém se despede de um amigo imaginário. O imaginário apenas te impulsiona, porque no demais, ele não existe.